Crítica Teatral que postei no meu antigo blog há algum tempo, logo no começo da faculdade. Mas apesar da inexperiência, acredito que ficou bem bacana. Na época eu estava no final do primeiro semestre da faculdade, hiper empolgada. Ainda tenho muito dessa empolgação, ainda bem, mas fica um pouco o receio de não ter a maturidade e a vivência que tanto dizem ser necessária para se fazer uma boa crítica. E, desde que notei o tamanho de minha responsabilidade como jornalista e formadora de opinião, bate aquele friozinho na barriga e a vontade de me preparar melhor antes de escrever sobre algo.
Vale a pena ressuscitar este post.
Espetáculo: DOIS
Por: Giovana Torres Pessoa
O espetáculo Dois questiona de forma bastante instigante a dualidade dos seres humanos. Questiona o modo como a vida tem ganhado um ritmo frenético e descontrolado. Isso nos leva, muitas vezes, à alienação, à falta de conhecimento de si mesmo, e da sociedade em que vivemos.
Em ritmo acelerado a personagem descreve sua rotina no trabalho dizendo repetidas vezes: pego papel; carimbo papel; assino papel; entrego papel. Uma descrição tão simplista revela como a fragmentação do trabalho e a repetição apenas mecânica deste fazem com que a própria personagem não se reconheça no que está fazendo, e dessa forma não vê valor em si mesma.
Desvalorizado profissionalmente, tanto quando se refere ao reconhecimento social quanto financeiro, a personagem mostra sentir-se impotente pois, mesmo trabalhando incessantemente, não ganha o suficiente para garantir conforto à família e manter as contas em dia. Além de passar pouco tempo com os entes queridos e ter seu único momento de lazer ao assistir a novela – que termina sempre com um final feliz. Como todo ser humano, está em busca da felicidade. Vendo sua vida ser marcada pela desvalorização, pelo vazio, pela ausência, a personagem termina solitária. Mergulhado em suas lembranças conclui, no fim, não ter nascido para ser feliz.
Todos buscamos a felicidade, mas para alcançá-la não basta apenas o sucesso pessoal, mas também o das pessoas que nos cercam. Pois a felicidade só existe quando todos somos livres – quando podemos agir a partir de nossas próprias escolhas, de forma consciente e responsável – e chegamos à concórdia. Não há, então, felicidade quando uma pessoa se aproveita da outra, ou uma classe explora a outra. Acredito que hoje todos nós somos, de certa forma, infelizes. Quando no conforto do nosso carro, com ar condicionado ligado, é só olhar para o lado para ver uma criatura em uma sobrevida. Pessoas jogadas na rua, sem os cuidados mais básicos como higiene e alimentação. Se não formos conformistas ou insensíveis, somos infelizes quando temos uma sensação de impotência por não poder resolver a situação como um todo. O espetáculo nos leva à essa reflexão profunda sobre as coisas mais básicas da vida, e que não é garantida à todos. Nas grandes cidades muitas vezes as realidades diferentes são extremamente próximas uma das outras.
Fica subentendido a pergunta: Hoje, com todos os avanços científicos e tecnológicos, será que somos civilizados?
Será que “a luta de todos contra todos”, sobre a qual Hobbes dizia ser a condição em que o homem vivia no Estado de Natureza, terminou ou continua hoje na “selva de pedra”? Estamos vivendo o que Lipowetski chamou de “A era do vazio”, na qual o mundo é marcado pelo individualismo, egoísmo, egocentrismo, apatia política e a preocupação apenas com o prazer imediato. É uma discussão antiga, mas válida até os dias de hoje.
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